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Caveirão provoca polêmica na Praia Vermelha

  

 O debate promovido na última segunda-feira, 16 de abril, pela Escola de Serviço Social (ESS/UFRJ) sobre o “Caveirão” mexeu com os ânimos de um auditório lotado no Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH).

 

Na entrada do auditório, antecipando um pouco do que seria o evento, estavam afixados os resultados da enquete realizada por alunos da ESS. Foram consultadas 199 pessoas, dentre as quais, 188 responderam que sabem o que é o “caveirão”, frente a seis, que desconhecem o veículo blindado usado pelo Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (BOPE). Enquanto 15 das pessoas entrevistadas são favoráveis ao veículo, 160 são contra; 163 pessoas declararam que não se sentiriam mais seguras caso o “Caveirão” passasse em suas ruas, enquanto apenas dez responderam que sim. Por fim, quando questionadas quanto à eficácia do veículo como instrumento de combate à violência, 179 pessoas disseram que não acreditam que ele cumpra essa função, enquanto somente dez afirmaram o contrário.

Compondo a mesa de discussão estavam presentes os deputados estaduais Marcelo Freixo, do PSOL/RJ e Flávio Bolsonaro, eleito pelo PP/RJ, o tenente-coronel Mario Sérgio de Brito, ex-comandante do Batalhão da Maré e Maurício Campos, da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência.

O ex-comandante do batalhão do Complexo da Maré classificou o carro blindado como um instrumento de proteção ao policial, afirmando ainda, que o Rio de Janeiro não é o primeiro a fazer uso desse tipo de equipamento, e que, hoje em dia na polícia, a perda de homens em confrontos, por falta de equipamentos básicos como colete à prova de balas de fuzil, é comum.

Em sua fala, Freixo primeiramente abordou a questão da agressão que o “caveirão” representa. “Ele é um símbolo e não tem esse nome à toa”- disse, contando ainda a mensagem que mais freqüentemente é disparada por seus alto-falantes “Sai da frente; Vim buscar sua alma!”. Em sua opinião, e na da maioria da platéia – pelo que se viu na quantidade de aplausos que o deputado recebeu – o policial que está dentro do carro, fala pelo Estado e tem responsabilidades que isso acarreta. O Estado, que na maioria das vezes, deixa de entrar com saúde, educação e trabalho nas comunidades carentes só se faz presente através do medo.

Marcelo lembrou que se o carro blindado já foi usado outras vezes e em outros lugares, o primeiro dos quais foi na África do Sul, durante o Apartheid. “Hoje, a segurança pública é instrumento de uma política de apartheid. Não dá para levar esse debate para o lado pessoal, obviamente todos queremos o policial vivo, mas levando em conta que 75% das mortes de policiais não acontece no serviço, mas voltando para casa, vemos que com o ‘caveirão’, o que se tem, é uma política de controle de gueto”, disse ele.

 

Bolsonaro, que iniciou seu discurso ironizando a fala anterior, segundo ele “uma piada”, declarou que o policiamento e as operações policiais na Zona Sul têm de ser completamente diferente dos de uma favela, propondo, também em tom de ironia, que no próximo orçamento de segurança se pusesse uma cifra destinada a comprar pombas brancas, que deixariam a cidade mais em paz. Segundo ele, pobreza não seria sinônimo de criminalidade, mas não há como resocializar alguém que nem socializado foi, se referindo aos criminosos. “Parece que a culpa da quantidade de mortes é do policial, não do marginal”, disparou por fim.

– Seria muito interessante fazer um debate desses com os soldados que estão em confronto com a comunidade no dia-a-dia – ,  foi essa a primeira questão levantada por Mauricio Campos, da Rede Comunidades e Movimentos Contra a Violência. Segundo ele, o blindado só serve para a manutenção de um sistema de guerra na cidade, assim como para garantir a sensação de segurança, na Sul e no asfalto, de uma maneira geral. Valeria à pena, na visão das políticas de segurança, sacrificar a população carente das favelas. Ele lembrou que o negócio pesado do tráfico não está baseado nas favelas, e por isso, há que se pensar no fato de que o confronto não é uma solução: a droga geralmente vem de fora da favela; e nem o policial é o culpado, ele só cumpre ordens que vem de cima.