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Jornada debate parceria universidade, indústria e governo

Pesquisadores em Farmacologia deixam de lado o discurso de autonomia universitária e apostam na tripla parceria

A II Jornada do Programa de Pós-graduação em Farmacologia e Terapêutica Experimental, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB), apresentou as pesquisas realizadas pelos estudantes dos três programas de Pós-graduação e discutiu as possibilidades para o futuro da Farmacologia no Brasil. Para os professores e médicos presentes na mesa redonda Parceria indústria – universidade para desenvolvimento dos fármacos: aspectos práticos, a união de interesses entre universidade, indústria e governo é a saída para o necessário impulso do desenvolvimento farmacológico.

A jornada ocorreu nos dias 18 e 19 de dezembro, organizada em mini-conferências, duas conferências e uma mesa redonda. Segundo o professor Roberto Takashi Sudo, coordenador do referido Programa de Pós-graduação, o objetivo é dar oportunidade aos alunos de ministrar palestras e apresentar seus trabalhos. Foi selecionado um estudante de cada laboratório que, como destaca o Roberto Takashi, “tem orientadores de diferentes instituições, como o Instituto Nacional do Câncer, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e, claro, a Faculdade de Farmácia (FF)”, para a apresentação. Os outros puderam expor pôsteres sobre suas pesquisas.

O dia 19 foi dedicado à discussão sobre o processo de desenvolvimento de novos fármacos. Após a conferência do professor Eliezer Barreiro, do Laboratório de Avaliação e Síntese de Substâncias Bioativas (Lassbio/FF), uma mesa redonda apresentou diferentes aspectos do tema central. O professor Carlos Alberto Manssour Fraga, também do Lassbio, destacou a importância de aprovações de leis, como a Lei da Propriedade Industrial (1997), Lei dos Medicamentos (1999) e a Lei de Inovação (2004), para o incremento da pesquisa e indústria na Farmacologia. “O que a gente percebe é que, até 1997, o Brasil não se interessava por medicamentos”, resume o professor.

Com detalhada explicação, Carlos Alberto demonstrou que as empresas brasileiras estão interessadas apenas no mercado interno, o que dificulta o custeio de algumas fases da pesquisa. A idéia é que o retorno do mercado interno não é satisfatório para que se invista em fases mais caras, como a testagem em humanos, por exemplo. Entretanto, o professor colocou o momento atual como “época blockbuster”, uma vez que saímos da produção de medicamentos do milhão, na década de 1970, para o bilhão por ano.

Marco Aurélio Martins, da Fiocruz, acredita que um dos maiores obstáculos para o desenvolvimento brasileiro na área de fármacos reside na pouca importância à proteção intelectual, leia-se daí, a solicitação de patentes. “Podemos perceber como pouco valorizamos a patente no Brasil quando vemos a pontuação do Capes para esse quesito: apenas quatro, enquanto que a publicação indexada vale 20 pontos”, exemplifica. O professor ainda compara o salto em patentes na Coréia do Sul, que, segundo ele, está diretamente relacionado ao incentivo a pesquisa. Segundo ele, a biossegurança, a bioética, a dificuldade em importar animais e substâncias, e, ainda, a estrutura laboratorial são os principais “gargalos”, que dificultam o incremento na área.

O representante da indústria, Jorge Afiune, diretor médico do Laboratório Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos, completou as palavras dos participantes, concluindo que a tripla parceria é a saída para a Farmacologia. Um diálogo com transparência e ética possibilitará o salto em pesquisa e produção de fármacos, “pois criatividade a universidade tem; recursos, o Governo e a indústria possuem”, disse.

Se antes a universidade se afastava da indústria, temendo perder sua autonomia, parece que hoje isso não é mais problema para os professores e pesquisadores em Farmacologia. “Esse pensamento é ultrapassado. A universidade não é apenas ensino, tem também que gerar produtos. Só podemos produzir, se tivermos a indústria ao nosso lado”, comentou Roberto Takashi. Para ele, a indústria está interessada, em aliança com o lucro, no benefício social, e é de comum acordo que as partes devem trabalhar. Estudantes, no entanto, não costumam partilhar dessa opinião. A jornada pode, talvez, ser o primeiro passo para uma discussão mais ampla sobre a relação que a universidade deve ter com as empresas, indústria e sociedade.