A síndrome cardiopulmonar causada por hantavírus é uma doença que mata quatro em cada dez pessoas contaminadas, uma elevada taxa de mortalidade para a infecção que pode ser provocada por diversos tipos desses vírus transmitidos por roedores silvestres. Para ajudar as chances dos pacientes agilizando o diagnóstico, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) desenvolveram um novo teste rápido capaz de detectar a doença em 15 a 20 minutos com apenas uma gota de sangue. O produto já obteve registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A hantavirose ocorre em todas as regiões do Brasil, com maior concentração de casos no Sul, Centro-Oeste e Sudeste. De 2015 a 2024, foram 610 registros no país, com 232 mortes. Notificações preliminares deste ano somam 11 casos, incluindo seis mortes. As infecções por hantavírus ocorrem principalmente em áreas rurais, pela inalação de partículas virais liberadas na urina, fezes e saliva de roedores, que ficam suspensas no ar na forma de aerossóis.
O quadro clínico inicial da hantavirose é semelhante a muitas doenças virais, incluindo febre, dor nas articulações, na cabeça e no abdômen, além de manifestações gastrointestinais, como vômito e diarreia. Com a progressão da doença, os pacientes podem apresentar também dificuldade de respirar, batimentos cardíacos acelerados, tosse e pressão baixa.
Embora não exista um medicamento específico contra o hantavírus, o diagnóstico precoce da doença é fundamental para que os pacientes recebam o tratamento adequado, incluindo terapias para controlar os sintomas e medidas de suporte que podem ser decisivas para salvar vidas.
O projeto uniu equipes da Fiocruz e da UFRJ
A médica infectologista Elba Lemos, idealizadora do teste e coordenadora do Laboratório de Referência Regional para Hantaviroses junto ao Ministério da Saúde, vinculado ao Laboratório de Hantaviroses e Rickettsioses do IOC, ressaltou que o teste rápido pode ser um “divisor de águas”, orientando o atendimento inicial dos pacientes, enquanto análises de confirmação são realizadas pelos serviços de referência.
Segundo Elba, a hantavirose pode ter evolução rápida para insuficiência respiratória. Por isso, a letalidade é alta. “Um teste rápido, que pode ser realizado na unidade de saúde, com resultado em até 20 minutos, é muito importante para orientar o manejo do paciente e salvar vidas”, declara a infectologista.
O gerente do Departamento de Desenvolvimento de Reativos para Diagnóstico de Bio-Manguinhos, Edimilson Domingos da Silva, destaca o ótimo desempenho do kit nas avaliações realizadas, sinalizando alta capacidade de detectar a doença e baixíssima probabilidade de reações falso-positivas em amostras verdadeiramente negativas para hantavirose ou referentes a outras doenças.
Segundo ele, o kit é de fácil aplicação, sem a necessidade de ambiente laboratorial e vai ter um impacto relevante na abordagem aos afetados pela doença. “É Importante salientar que, com este nível de especificidade (100%), a diferenciação entre hantavirose e dengue vai auxiliar muito a conduta clínica no tratamento dos pacientes”, afirma.
Além de Elba e Edimilson, lideraram a iniciativa Renata Oliveira, chefe do Laboratório de Hantaviroses e Rickettsioses do IOC; Karen Trinta, pesquisadora de Bio-Manguinhos; Ronaldo Mohana Borges, chefe do Laboratório de Biotecnologia e Bioengenharia Estrutural do IBCCF/UFRJ; e Janaína Mansur, então pesquisadora de pós-doutorado do mesmo laboratório da UFRJ.
Por meio de acordo de parceria, a UFRJ forneceu as proteínas e transferiu a tecnologia de produção para Bio-Manguinhos, unidade da Fiocruz que atua no desenvolvimento tecnológico e fabricação de vacinas, kits para diagnóstico e biofármacos.
O diagnóstico laboratorial da hantavirose é realizado por meio da detecção de anticorpos contra o hantavírus, que são produzidos pelo sistema imune dos pacientes para enfrentar o patógeno e aparecem no sangue logo após a infecção. Por isso, para identificar a doença, os exames devem conter proteínas virais que sejam capazes de se ligar aos anticorpos.
Para compor o novo teste, cientistas do Laboratório de Hantaviroses e Rickettsioses do IOC selecionaram a sequência genética de uma proteína viral, chamada de proteína do nucleocapsídeo, de dois diferentes hantavírus. A escolha considerou características dos microrganismos e da resposta imune dos pacientes.
Especialistas na produção de proteínas recombinantes, os pesquisadores do Laboratório de Biotecnologia e Bioengenharia Estrutural do IBCCF/UFRJ realizaram a expressão, purificação e caracterização dessas proteínas virais, utilizando bactérias para produzir as moléculas, como se fossem fábricas.
De acordo com o professor Ronaldo Borges, com essa metodologia foi possível produzir as duas proteínas recombinantes com a estrutura tridimensional correta para serem identificadas pelos anticorpos que circulam no sangue dos pacientes infectados por hantavírus. “Dessa forma, elas podem ser usadas como um detector de anticorpos nos testes”, ressaltou Borges.
Idealizado pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e desenvolvido em parceria com o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) e o Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho (IBCCF/UFRJ), o projeto do kit contou com financiamento da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e do Programa Inova CEIS da Fiocruz.
Com informações da Assessoria de Comunicação da Fiocruz
