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Pelo Campus

Minorias na pós-graduação

Curso preparatório que ajuda grupos minoritários a acessar o mestrado e o doutorado em Ecologia recebe alunos durante todo o ano

Criado para reparar a exclusão histórica no espaço acadêmico, o curso de extensão Prepara Eco, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), auxilia negros, indígenas, quilombolas, pessoas com baixa renda, pessoas com deficiência, mães e transgêneros a ingressarem no Programa de Pós-Graduação em Ecologia. A iniciativa surgiu do incômodo das doutorandas do programa Amanda Santos e Verônica Marques sobre a falta de diversidade no perfil de alunos de mestrado e doutorado. O curso aceita inscrições a qualquer momento por meio de formulário. As aulas ocorrem virtualmente e ficam gravadas.

Em seu terceiro ano de funcionamento, o projeto acumula aprovações. Na seleção de 2023 do Programa de Pós-Graduação em Ecologia, 67%, ou seja, mais da metade dos alunos, conseguiram vaga no mestrado ou doutorado. Das três vagas para ações afirmativas no processo seletivo, dois alunos que foram aprovados participaram do preparatório. Os resultados foram divulgados em artigo recente na revista Oecologia Australis, publicada pela Associação Brasileira de Ciência Ecológica e Conservação (Abeco).

As aulas contemplam assuntos gerais e específicos da área da Ecologia e noções  pertinentes ao processo seletivo, como escrita, apresentação do projeto de pesquisa, estatística e questões de língua inglesa. As etapas da seleção são o principal obstáculo para os alunos, segundo Amanda Santos, uma das criadoras do Prepara Eco. “A maioria não conhece o processo para ingressar em uma pós-graduação. Não sabe como funciona, como deve se inscrever, como procurar um orientador, como saber as linhas de pesquisa do programa, escrever um projeto de pesquisa. Por isso, nós estruturamos um beabá sobre como ingressar no PPG Ecologia da UFRJ”, destaca. O curso também oferece palestras abertas a toda a comunidade a respeito de temas sociais como racismo ambiental. 

Para participar das aulas, é necessária a inscrição, que solicita uma autodeclaração, além do envio de um vídeo de três minutos contando a trajetória universitária para que a comissão de heteroidentificação entenda a relação do candidato com a realidade social dos grupos minoritários atendidos pelo projeto. O curso tem um período recomendado de inscrições, que, em 2024, foi até 10/7, porque seguem um cronograma. No entanto, as aulas ficam gravadas e disponíveis aos que entrarem no preparatório após o início dos estudos. As inscrições podem ser feitas pelo site do  Prepara Eco. 

“A presença desses grupos na pós-graduação é essencial em termos de representatividade, para que outras pessoas pertencentes aos mesmos grupos saibam que o espaço da pós-graduação também é para elas, e para a promoção de igualdade e justiça social. A diversidade de pessoas também traz consigo uma diversidade de realidades e conhecimentos, que só tem a somar com a construção de conhecimento gerada pelas pós-graduações”, afirma Amanda, que também é pós-doutoranda em Ecologia.

Mudanças estruturais  

Historicamente, a Academia é marcada por preconceitos de raça, classe e gênero. Na graduação, a Lei de Cotas, aprovada em 2012 e reformulada em 2023, modificou o perfil de alunos, mas, na pós-graduação, o cenário é ainda predisposto a desigualdades de acesso e permanência. Um levantamento de 2020 da Liga de Ciência Preta Brasileira, a partir de dados da Plataforma Lattes, mostra que 15,4% dos pós-doutorandos do Brasil são negros e menos de 0,5% é indígena. 

Nos últimos anos, a UFRJ tem se esforçado para mudar essa realidade dentro da instituição. Em 2023, a Universidade criou a Superintendência-Geral de Ações Afirmativas, Diversidade e Acessibilidade, responsável por propor e executar políticas de acesso e organizar eventos ligados à temática racial, como o Novembro Negro. Em 2022, o Conselho Universitário (Consuni) decidiu que todos os programas de pós-graduação da Universidade devem reservar pelo menos 20% das vagas para negros e indígenas, 5% para pessoas com deficiência e dar pontuação bônus para mulheres com filhos de até 5 anos. Também ficou definido, no texto aprovado, que professores precisam priorizar estudantes de baixa renda na hora de  escolher bolsistas. Além dessas iniciativas, a UFRJ conta com auxílios para a permanência dos estudantes. 

“Esperamos que essa representatividade na pós se reflita em uma diversidade no corpo docente daqui a alguns anos, e que enfim a universidade e a ciência se tornem diversas, inclusivas e antirracistas”, finaliza a pós-doutoranda.