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Opinião

Da sala de aula: atravessamentos sobre formar professores

Em relato pessoal, Daniela Patti conta sua trajetória até se tornar professora da Faculdade de Educação da UFRJ

Minha inserção profissional no magistério no ensino superior iniciou em 2001, após a conclusão do mestrado. Não foi planejada, mas foi com o  convite de uma amiga para assumir uma disciplina de Metodologia Científica que essa história começou. 

Durante oito anos atuei como professora em duas instituições de ensino superior privadas, em diferentes licenciaturas, conhecendo a realidade de estudantes trabalhadores, alunos e alunas dos cursos noturnos que, com muita dificuldade, pagavam as mensalidades. Em 2005, vi chegar ao ensino superior a primeira geração de bolsistas do Prouni, muitos deles a primeira pessoa da família a chegar à faculdade. Como professora horista, ministrava diferentes disciplinas a cada semestre. Afinal, meu salário era proporcional à minha carga horária. Mais turmas, melhor remuneração. E, também, maior precarização, já que eram muitas aulas para preparar, muitos trabalhos e provas para corrigir. Cheguei a ministrar cinco disciplinas diferentes no mesmo semestre. 

Em uma das instituições privadas em que atuei, assumi a coordenação do curso de Pedagogia, o que demandava muito trabalho administrativo e pedagógico sobre organização curricular, atendimento de estudantes, muitos processos para responder, a preocupação com o desempenho do curso no Enade, as oscilações das matrículas e o receio da perda do emprego, salários atrasados; enfim, a dura realidade de trabalhar no ensino superior na iniciativa privada, com muita concorrência. Eu precisava buscar melhor qualidade de vida e de trabalho, e, para isso, o doutorado era uma importante estratégia, dando início, em 2002, à minha aproximação com a Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Ingressei como ouvinte em um grupo de pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação. E, buscando estreitar meus laços com a instituição, assumi, em 2003, uma vaga de professora substituta na Faculdade de Educação para um contrato de dois anos. Nesse momento começou minha história com as licenciaturas oferecidas pela UFRJ. Uma experiência incrível conhecer a Universidade como docente, trabalhar com estudantes de diferentes cursos na Praia Vermelha, no Fundão e no Ifcs – Instituto de Filosofia e Ciências Sociais. Eram três empregos e mais de 400 alunos por semestre. Uma imensidão de aulas para preparar, trabalhos e provas para corrigir.

Em 2004, mergulhada no trabalho, terminando meu contrato como substituta na UFRJ, percebi que era hora de voltar à pesquisa e ingressei no doutorado em Educação da UFRJ, incorporando o curso a uma rotina de trabalho já exaustiva. Dirigia 500 quilômetros por semana para dar conta de tantas atividades. Minha experiência como professora substituta apresentou meu problema de pesquisa da tese: como articular a formação pedagógica com a formação disciplinar dos estudantes dos cursos de licenciatura da UFRJ? Como montar um curso que faça sentido para esses jovens professores? Como a Faculdade de Educação pode se constituir em um território legítimo de formação para o magistério? 

Foi ali que tomei a decisão de que a UFRJ seria meu lugar de trabalho e, em 2008, dois meses depois de concluir o doutorado, fui aprovada em primeiro lugar como docente do Departamento de Administração Educacional. Depois de tantos anos, a possibilidade de ser uma professora 40 horas com dedicação exclusiva iria permitir o desenvolvimento de pesquisas, a realização de dois pós-doutorados, a orientação de monografias, dissertações e teses, escrita de artigos, oferta de cursos de extensão gratuitos, uma efetiva dedicação a uma universidade pública, gratuita e socialmente referenciada. 

Passados mais de 20 anos como docente do ensino superior e quase 14 anos como professora de Educação Brasileira na UFRJ, só tenho gratidão aos alunos e às alunas de graduação, especialização, mestrado e doutorado com quem tenho compartilhado saberes, experiências e angústias da profissão docente. A sala de aula é, para mim, um espaço plural de trocas e aprendizagens, um enorme desafio. As turmas reúnem alunos de cursos muito diferentes – Artes, Dança, Física, História, Pedagogia, Letras, Biologia… Um universo multifacetado de visões de mundo, desejos, angústias e trajetórias escolares reunido para debater a educação brasileira, os avanços e recuos da política educacional. 

São os alunos e alunas que, a cada semestre, constroem a disciplina comigo e me ajudam a construir resistências a tantos ataques à educação pública. A cada mensagem que recebo, falando de como a disciplina foi relevante na formação deles e delas, renovo as forças para ser uma docente que afeta e que é afetada cotidianamente. 

Depois de cinco semestres concluídos em dois anos remotos, fica a certeza de que a Universidade não parou. Portanto, ela não vai “voltar” em abril, no início do ano letivo de 2022. Trabalhamos muito em um cenário devastador para tantas famílias brasileiras. Minha torcida e esperança é pelo reconhecimento e valorização da ciência, da importância da UFRJ no cenário nacional e da relevância do seu papel social como formadora de professores para a educação básica. É como diz a letra: “Tudo é uma questão de manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo”. Afinal, tudo passa. 

Daniela Patti: pedagoga, mestre e doutora em educação, professora da Faculdade de Educação da UFRJ.