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Beatriz Nascimento é doutora honoris causa in memoriam pela UFR

Sob temáticas ligadas à história e à cultura negra, Beatriz Nascimento exerceu sua militância intelectual enquanto mulher negra

Atualizado às 8h45 de 29/10/2021

O Conselho Universitário (Consuni), órgão máximo da UFRJ, concedeu o título póstumo de doutora honoris causa a Maria Beatriz Nascimento, mais conhecida por Beatriz Nascimento. O reconhecimento do Conselho aconteceu nesta quinta-feira, 28/10, sob unanimidade e aclamação.

“É um momento muito emocionante! Aplausos de pé para Maria Beatriz Nascimento, que passou por dificuldades de gênero, por ser mulher, e étnicas, por ser negra. Não estamos só homenageando uma intelectual negra, mas a genialidade da negritude. É com muita honra que sou eu, hoje, a reitora a conceder o título a ela, que morreu defendendo, justamente, o gênero feminino. Toda a vida de Beatriz foi marcada pela importância dos quilombos como espaços autônomos de expressão da negritude. É uma merecidíssima homenagem! Parabéns à família de Maria Beatriz Nascimento, à Escola de Comunicação (ECO), ao Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) e à Comissão de Ensino e Títulos (CET)”, afirmou a reitora da UFRJ, Denise Pires de Carvalho.

A outorga do título de doutora honoris causa foi um pedido da ECO. Sergipana, historiadora, docente, roteirista, poetisa e ativista pelos direitos humanos de negros e mulheres brasileiras, Beatriz chegou a iniciar o mestrado em Comunicação na ECO sob orientação do professor Muniz Sodré, em 1994. No ano seguinte, aconteceu uma tragédia. Ela foi vítima fatal de feminicídio, em Botafogo, Zona Sul do Rio, pelo companheiro de uma amiga, por achar que ela interferia em sua vida privada. Beatriz havia aconselhado a amiga a terminar a relação por sofrer agressões.

Beatriz Nascimento era multifacetada | Foto: Divulgação

Beatriz deixou um legado em produção acadêmica: Kilombo e memória comunitária: um estudo de caso, publicado na revista Estudos Afro-Asiáticos; O conceito de quilombo e a resistência cultural negra, publicado na revista Afrodiáspora, que se tornou um de seus textos mais reeditados; a publicação do capítulo Introdução ao conceito de quilombo na coletânea Negro e cultura no Brasil, em 1987; O movimento de Antônio Conselheiro e o abolicionismo: uma visão da história regional, publicado na Revista do Patrimônio (Iphan), em 1997. A autora também publicou os seguintes textos: Por uma história do homem negro, Revista de Cultura Vozes,1974; Negro e racismo, Revista de Cultura Vozes, 1974; A mulher negra no mercado de trabalho, Jornal Última Hora, 1976; Nossa democracia racial, Revista IstoÉ, 1977; Daquilo que se chama cultura, Jornal IDE, 1986;A mulher negra e o amor, Jornal Maioria Falante, 1990.

“A diferenciação de prismas — do escravo para o negro — foi se tornando para Maria Beatriz Nascimento um horizonte de estudo, pesquisa e ativismo. Em seus primeiros escritos, na metade da década de 1970, ela delineou a ideia de uma “história do homem negro”, uma história negra feita por pessoas negras, algo incomum para a época”, lembra Clynton Lourenço Correa, relator do processo no Consuni.

Beatriz Nascimento fez graduação em História (1968-1972) e especialização (1979-1981) na UFRJ. Além disso, iniciou o curso de mestrado em História na Universidade Federal Fluminense (UFF). Parte de sua pesquisa, realizada de maneira independente de qualquer instituição acadêmica, consistia em observar — em campo e via documentação — os quilombos como sistemas alternativos à estrutura escravista, com potencial continuidade em favelas, particularmente no caso do Rio de Janeiro.

“A concessão do título póstumo de doutora honoris causa a Maria Beatriz Nascimento favorece a ampliação do conhecimento de quem dedicou a vida à análise, além da que vigorava naquela época, da temática de negros e negras no Brasil e à defesa dos direitos das mulheres. Maria Beatriz Nascimento praticou em vida o que pregava no seu ativismo”, destacou Clynton.