Produções culturais movimentam a Universidade

Estudantes produzem eventos, cursos, exposições e outras formas de apresentação

Cultura: verbete muitas vezes difícil de ser definido. Por alguns desavisados, visto como balbúrdia. Fato é que a cultura é um dos pilares de uma sociedade, e, contraditoriamente, em tempos de crise é uma das primeiras áreas a perder incentivos. Nesses momentos, ou intencionalmente, como forma de acabar com a memória de um país. Hoje assistimos a um verdadeiro desmonte na área cultural brasileira, com incentivos encerrados e órgãos desfeitos.

Em tempos com tantas restrições de movimentação e sociabilidade, as manifestações culturais têm sido um alento e respiro. Lives e eventos virtuais de todos os tipos, em diferentes categorias e segmentos, acontecem desde o início da pandemia de COVID-19. Apesar de o cenário não ser um dos mais favoráveis, a cultura resiste. Produtores culturais fazem o possível para que ela não morra no Brasil. Na Universidade Federal do Rio de Janeiro, alunos promovem diversas ações, em diferentes áreas, mostrando que a cultura na maior universidade federal do país não para.

Como forma de apoio a tais iniciativas, a Pró-Reitoria de Políticas Estudantis (PR-7) lançou o Edital de Apoio a Eventos do Estudante. Foram contemplados 17 projetos, totalmente desenvolvidos e produzidos por alunos, respeitando a diversidade de temas e linguagens.

Produção musical mais acessível

O projeto Criação e Produção Musical com Smartphone foi um dos finalistas. Idealizado por Péricles de Morais, estudante do curso de Música, ele objetiva simplificar o acesso à área musical. Segundo Péricles, “muitas pessoas interessadas em músicas ainda acreditam ser necessário um conhecimento técnico extremamente aprofundado para gravação e produção musical. Desmistificar essa ideia e mostrar as ferramentas necessárias às criações possíveis através do próprio smartphone é uma forma de quebrar essa concepção e ao mesmo tempo fazer com que as pessoas entendam os procedimentos envolvidos no âmbito da música”.

A democratização dos processos de criação e produção musical são os objetivos do curso idealizado por Péricles de Morais | Foto: acervo pessoal.

O curso terá duração de vinte horas e será ministrado ao longo de dez encontros pela plataforma Google Meet. Os participantes aprenderão  os processos de criação e produção musical atuais. No fim dos encontros, o objetivo é que os cursistas sejam capazes de produzir as próprias criações musicais e que elas possam ser utilizadas em diversos tipos de linguagens e produções artístico-culturais. As inscrições poderão ser feitas pelo formulário O curso terá início no dia 16/8.

Questões filosóficas por meio da técnica de animação

Mundo Desconhecido em Mim é uma série de animação com três episódios  que será produzida por Raul Baldi, aluno do curso de Filosofia da UFRJ.  O roteirista, compositor e animador abordará questões que nascem do isolamento social, como mudanças de humor e comportamento, sociabilidade e perspectivas para o futuro próximo. O projeto, voltado para crianças entre 7 e 10 anos, pretende construir diálogos filosóficos a partir do personagem Sebastian, que questiona a própria existência e busca entender quem é no mundo, narrando sua trajetória diária e a dificuldade em manter o humor estável e se concentrar em suas atividades.

Essa é a primeira temporada da série, mas Raul pretende expandir a ideia. “É um projeto que idealizo faz tempo, mas precisava de um estímulo para começar. Neste primeiro momento, estou aberto à experimentação da série, obviamente com muito cuidado com o roteiro e buscando trazer sutilezas a respeito da linguagem, porque entendo que tudo o que vai para o mundo tem uma carga, ainda mais quando se vincula o nome de uma instituição.”

Raul revela, ainda, que sempre se interessou pelo universo infantil por acreditar que “as crianças são o futuro da transformação que muito se espera, de pessoas que acreditam e entendem a urgência da real democratização do conhecimento e oportunidades . Os episódios poderão ser conferidos no canal @raulbaldi no Youtube a partir de 6/9, com programação semanal.

Um espaço para a multiplicidade

Beatriz Ellen Roza, Clarelis Rodrigues da Silva e Bárbara de Paula, todas estudantes do curso de História da Arte, são as idealizadoras do Para Além da Margem. A proposta é montar uma exposição virtual com obras produzidas por artistas negras. Segundo as organizadoras, o projeto vem suprir a necessidade de ampliação de espaços de produção e exibição de trabalhos de mulheres, pessoas LGBTQIA+ e pessoas racializadas, que continuam sendo minoria e não têm seus trabalhos reconhecidos e expostos no circuito convencional, apesar de produzirem, muitas vezes, em grande quantidade.

O projeto foi motivado pela dificuldade de obter experiências práticas na área de História da Arte junto à necessidade de espaços expositores direcionados a artistas negras. Quando se estuda História da Arte, a presença de artistas  − homens brancos − nos manuais e exposições é enorme; entretanto, os nomes das mulheres − principalmente das negras − mal são citados, apesar de haver artistas notórias que deveriam compor o estudo da arte e artistas contemporâneas que estão produzindo atualmente”, diz Beatriz.

Qualquer artista que esteja dentro do perfil do projeto poderá enviar seu material. As informações deverão ser acompanhadas pelo Instagram @paraalemdamargem.

Comunicação e educação em pauta

Um curso de Comunicação Popular será produzido pelo coletivo RUA UFRJ, composto por Gabrielle Braz Santos Brandão, Leandro Palhares Bezerra Salvador, Analice Madeira Teixeira da Silva e Lorena Soares de Paiva Silva, estudantes de Geografia, Biomedicina e Psicologia, respectivamente. No ano em que Paulo Freire completaria 100 anos, o projeto se dá em parceria com o Instituto de Formação Humana e Educação Popular (Ifhep), espaço existente há dez anos em Campo Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, e que objetiva transformar vidas por meio da educação popular.

Qualquer interessado poderá se inscrever no curso, que tem como principais públicos-alvo os estudantes de universidades, tanto públicas quanto privadas,  professores e técnicos de instituições de ensino, militantes de movimentos sociais, bem como antigos e atuais educadores e educandos do Iphep. As aulas serão transmitidas pelo canal no Youtube.

Essas são algumas das produções desenvolvidas pelos estudantes da UFRJ em tempos difíceis  e em meio a cortes de orçamento e até ameaça de fechamento em virtude da falta de verbas. A UFRJ resiste, assim como a cultura e várias outras áreas.