Nas últimas semanas o Brasil vem observando a mudança de direção da curva epidemiológica da COVID-19 e os resultados de uma flexibilização problemática. O aumento de casos de infecção pelo coronavírus pode ser sentido no dia a dia da população, com a lotação de hospitais, suspensão de cirurgias e exames eletivos na rede privada, crescente busca por leitos e testes diagnósticos.
De maneira diferente da Europa, que teve clara delimitação entre a primeira e a segunda ondas, o Brasil enfrenta agora um cenário ainda mais desafiador. Desde o início dos contágios em solo brasileiro, em março deste ano, não foi possível determinar o fim de uma “primeira onda”, já que a diminuição da curva de contágios vinha acontecendo de maneira muito lenta. Os especialistas, então, falam de uma “segunda onda sobreposta à primeira” ou, ainda, de um “repique”, segundo pico em uma mesma curva.
Para Roberto Medronho, professor da Faculdade de Medicina e coordenador do Grupo de Trabalho (GT) Multidisciplinar para o Enfrentamento da COVID-19da Universidade Federal do Rio de Janeiro,isso é muito grave:
“No estado do Rio de Janeiro, por exemplo, nunca deixamos de ter menos de 3 mil casos por semana”, explica.
Em nota, o GT da UFRJ afirmou que a flexibilização das medidas de segurança aplicadas no começo da pandemia, com a reabertura de praias, parques, bares, além de festas e da superlotação dos transportes públicos, foi o principal motivo do novo aumento sustentado da curva a partir de meados de outubro.
“O que observamos agora é que o resultado é um acúmulo de atitudes. Independentemente da curva, as medidas de flexibilização foram sendo aumentadas e a população passou a relaxar com as medidas de segurança pessoal também. São oito meses e parte da população já está cansada. Essa sensação de ter aprendido a conviver com a doença é falsa. Ainda temos muito a aprender”, ressalta Medronho.
Segundo o professor, o transporte público é um dos pontos que mais preocupa os especialistas, já que, desde o início da pandemia, segue lotado e sem a fiscalização necessária para evitar o contágio entre os passageiros. “As autoridades têm que aumentar a oferta dos meios de transporte. Mesmo que todos os passageiros usem máscara e álcool em gel, uma pessoa a centímetros de outra não está protegida”, explica.
Na nota divulgada pelo GT, os especialistas sugerem uma série de iniciativas para o controle da nova onda, como a abertura imediata de novos leitos de enfermaria e Unidades de Terapia Intensiva; contratação emergencial de profissionais de saúde; aquisição de insumos para a assistência de pacientes; ampla realização de testes PCR, com isolamento de pacientes positivos; suspensão de eventos presenciais, como festas, e fechamento de praias, além do aumento e reforço da fiscalização dos estabelecimentos abertos. O documento pede ainda que, caso as iniciativas não surtam efeito, as autoridades voltem a analisar a possibilidade de novo lockdown no estado.
“Precisamos orientar a população de que a pandemia não acabou e vem crescendo de forma sustentada. Temos que redobrar precauções porque estamos num momento muito delicado do processo. Estamos atravessando um mar muito revolto, mas já visualizamos a melhoria com a vacina”, conclui Medronho.
Leia na íntegra a nota do Grupo de Trabalho Multidisciplinar para o Enfrentamento da COVID-19.