Em meio às intempéries geradas pelo novo coronavírus, é preciso falar sobre a situação orçamentária da UFRJ. Em 2021, a instituição centenária terá o menor orçamento em uma década. A aparente apatia de investimentos na primeira universidade criada pelo governo federal, em 1920, não é de hoje e pode gerar dificuldades severas para a instituição no ano que vem se o Projeto de Lei Orçamentária (Ploa) 2021 não mudar. Apatia que não rima com a empatia da Universidade em contribuir com ciência para muitos desafios que assolam o país.
Mas nem só de más notícias vive a situação econômica da UFRJ: “após muitos anos encerrando as contas com déficit, fecharemos 2020 tendo garantido o pagamento de todas as nossas despesas do exercício”. Quem dá a boa-nova é o professor Eduardo Raupp, titular da Pró-Reitoria de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças (PR-3), que conversou com a reportagem do Conexão UFRJ. Confira a entrevista na íntegra.
Conexão UFRJ — Como a UFRJ encerra o ciclo econômico-orçamentário de 2020? Quais os pontos de atenção e de destaque?
Eduardo Raupp — Mesmo em um ano extremamente difícil em vários aspectos por conta da pandemia de COVID-19, em razão do isolamento social algumas despesas foram reduzidas: energia elétrica, água e alimentação nos Restaurantes Universitários (RUs). Somaram-se a isso os ajustes promovidos em diversos outros contratos de manutenção básica, como vigilância, limpeza e outros serviços terceirizados. Após muitos anos encerrando as contas com déficit, fecharemos 2020 tendo garantido o pagamento de todas as nossas despesas do exercício.
Outro ponto positivo a destacar foi a inclusão da dívida histórica com a Cedae para pagamento por precatórios, pois o passivo de quase R$ 50 milhões será honrado pelo governo federal, sem afetar as contas da UFRJ.
Em 2019, foram pagos R$ 65 milhões de despesas dos exercícios anteriores. Neste ano, outros R$ 36 milhões. Considerando que fecharemos o ano no azul, em 2021 não haverá pagamento de despesas do exercício anterior. Nós chegamos, assim, em condições de enfrentar um ano extremamente difícil sem ter carregado pendências de 2020.
Sobre o déficit, esses ajustes todos nos permitiram sair de uma dívida da ordem de R$ 200 milhões para menos de R$ 100 milhões. São R$ 97 milhões, na verdade.
Conexão UFRJ — Considerando a pandemia de COVID-19, como avalia o cenário para 2021, que terá o menor orçamento em 10 anos? O que há de mais grave? Serviços podem parar?
Raupp — Após um enorme esforço para colocarmos as contas da UFRJ em dia, fomos surpreendidos pelo Ploa 2021 com a inclusão de uma dotação orçamentária discricionária 17% menor do que prevê a Lei Orçamentária Anual (LOA) 2020, reduzindo dos atuais R$ 374 milhões para R$ 310 milhões, ou seja, R$ 64 milhões a menos, que correspondem a mais de dois meses de todas as despesas da instituição.
Esse corte afetou todas as ações orçamentárias, incluídas a de funcionamento, o antigo Reuni e assistência estudantil.
Assim como a LOA 2020, o Ploa 2021 prevê que a dotação orçamentária da UFRJ estará dividida em duas unidades orçamentárias: a 26245 (UFRJ) e a 93224 (Unidade Supervisionada). A parcela relativa a esta última ficará bloqueada até que o Congresso Nacional aprove um crédito para sua liberação.
Além disso, a maior parcela do orçamento total da UFRJ estará justamente na unidade que ficará bloqueada. Isso elevará as dificuldades em honrarmos os nossos compromissos caso o desbloqueio demore a ocorrer. Com o atraso na aprovação do orçamento de 2021 no Congresso, acreditamos que essa demora seja um risco sério a se considerar.
Diante desse cenário que se avizinha, caso não haja nenhuma alteração nos valores estabelecidos no Ploa 2021, é possível que tenhamos sérios problemas quanto ao pagamento das despesas de manutenção básica. Fizemos todos os esforços necessários em 2020 para que os contratos pudessem ser honrados sem sobressaltos, mas, com o corte, esse risco existe e, eventualmente, alguns fornecedores podem, sim, ter dificuldades.
Conexão UFRJ — Além das tentativas de diálogo com o governo federal, o que a Administração Central vem fazendo para mitigar os pesos da desaceleração histórica de investimentos na UFRJ ao descompasso da produção contínua de pesquisas para o desenvolvimento da própria sociedade brasileira?
Raupp — Diante da redução da dotação orçamentária da UFRJ ao longo dos últimos anos que retrocede, em termos reais, ao orçamento de 10 anos atrás e dos severos contingenciamentos ocorridos em especial entre 2012 e 2017, na ordem de R$ 213 milhões, que impactaram diretamente no orçamento dos exercícios seguintes, a articulação com a bancada parlamentar do Rio de Janeiro tem trazido novos recursos, tanto por meio de emendas individuais como de bancada. Essa aproximação tem sido importante para o desenvolvimento de projetos de pesquisa, bem como melhorias em algumas infraestruturas da instituição.
Em 2020, também obtivemos recursos extraorçamentários para investimento: cerca de R$ 2,5 milhões de reais, com base numa redistribuição feita pelo MEC.
Mas são alternativas insuficientes. É preciso que a recomposição do investimento seja feita de forma estrutural no orçamento para fazermos frente a todos desafios que temos para atualização das nossas instalações e capacidade tecnológica e de sistemas.
Conexão UFRJ — A PR-3 não é só Finanças, como você disse em um de seus primeiros discursos como pró-reitor da pasta. Os temas Planejamento e Desenvolvimento têm sido trabalhados com o desenrolar do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), por exemplo. Qual o balanço que você faz até aqui acerca dessas competências da pasta em 2020? E em 2021, o que se espera? O que ainda é preciso fazer? E o que isso impacta nas finanças da Universidade?
Raupp — Com a criação da Superintendência de Planejamento Institucional (SPI), foi possível avançarmos na elaboração do PDI, há muito carente de atualização.
Considerando o corte previsto na dotação orçamentária da UFRJ em 2021, este será um ano com muitos desafios, quando precisaremos da união de todos para que consigamos enfrentá-lo. Manter o controle das despesas será fundamental para o equilíbrio nas contas e para tentar minimizar o impacto causado pelo corte no orçamento previsto para 2021.
O planejamento também nos permite olhar para frente, para além da gestão do nosso subfinanciamento. Permite que a gente discuta a UFRJ que queremos e que possamos nos preparar para lutar pelos recursos necessários.
Conexão UFRJ — Por fim, neste final de ano, que mensagem gostaria de deixar?
“Eu gostaria de deixar uma mensagem de confiança na nossa Universidade. Atravessamos este ano dificílimo e nos preparamos para 2021 da melhor forma possível. Estamos assegurando a manutenção da assistência estudantil, incluídos aí todos os auxílios emergenciais criados para combater os efeitos da pandemia, e não precisamos mais reduzir contratos terceirizados. Precisamos expandir, buscar mais recursos, e isso passa pela disputa de políticas públicas adequadas para que possamos enfrentar a pandemia e nos preparar para o pós-pandemia. De imediato, significa lutar para reverter os cortes propostos no Ploa 2021. Mas a despeito do financiamento insuficiente, a UFRJ retomou o controle de suas contas e vamos seguir enfrentando com total transparência e equilíbrio os desafios que virão“.
— Eduardo Raupp, pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças