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Jornada universitária condena fim de direitos no campo

Entre os dias 24/4 e 13 /5, aconteceu na UFRJ a 4ª Jornada Universitária em Defesa da Reforma Agrária (Jura). Organizado e apoiado pela Pró-Reitoria de Extensão (PR-5), juntamente com grupos de estudo, pesquisa e extensão da Universidade e com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o evento contou com mais de 40 universidades participantes em todo o país, sendo 10 públicas e duas particulares só no Rio de Janeiro.

O tema dessa edição foi Pão, Terra e Paz: contra a Criminalização e Retirada de Direitos e teve o objetivo de trazer o atual debate da Reforma Agrária para dentro das universidades. Além disso, segundo os organizadores, procurou-se ampliar a discussão sobre a importância da Reforma Agrária para reduzir a violência no campo e promover uma alimentação saudável e livre de agrotóxicos.

 

Imagem colorida da Mesa de abertura do 4ª Jura, onde estão: Luana Cana e Marina dos Santos, do MST; Maria Malta, Pró-reitora de Extensão da UFRJ, e Paulo Alentejano, professor da UERJ.
Mesa de abertura do 4ª Jura: Luana Cana e Marina dos Santos, do MST; Maria Malta, Pró-reitora de Extensão da UFRJ, e Paulo Alentejano, professor da UERJ. Foto: Valéria Pereira Silva

 

Durante o evento, também houve críticas às medidas do governo federal que afetam o setor rural do país, como a Reforma da Previdência, e prejudicarão a aposentadoria de milhões de trabalhadores do campo.

A Jura surgiu a partir de outra jornada de luta realizada pelo MST há mais de 20 anos. Segundo a representante do movimento presente na abertura do evento, Marina dos Santos, a Jornada Nacional de Luta pela Terra e pela Reforma Agrária acontece sempre em abril, o mês em que ocorreu o Massacre de Eldorado dos Carajás, no ano de 1996.

A assistente social Valéria Pereira Silva, da Divisão de Integração Universidade Comunidade da PR-5, é a coordenadora da Jura na UFRJ desde 2016.xa0 Ela disse que, além das atividades nos campi, foram realizadas duas visitas a assentamentos rurais: “O objetivo foi contribuir com a formação dos estudantes, uma das diretrizes da extensão universitária, e aproximá-los da realidade e dos trabalhadores do MST. Fomos ao Acampamento Marli Pereira da Silva e ao Assentamento Roseli Nunes”.

Descaso do governo com os assentados

Mesas-redondas e debates sobre diversos temas no âmbito da Reforma Agrária fizeram parte do evento. A abertura aconteceu no campus da Praia Vermelha, teve a coordenação da Pró-reitora de Extensão, Maria Malta, e contou ainda com Marina dos Santos, dirigente do MST, e Paulo Alentejano, professor da Universidade Estadual do Rio de janeiro (Uerj).

Imagem colorida da exposição “Traços de Luta”, do fotógrafo Pablo Vergara.
Exposição “Traços de Luta”, do fotógrafo Pablo Vergara. Foto: Valéria Pereira Silva

 

Além do debate, a abertura contou também com a exposição “Traços de Luta”, do fotógrafo Pablo Vergara. Nas fotos, ele retratou a situação das pessoas que vivem e trabalham no campo. As fotos, em preto e branco, revelam a expressão de cansaço dessas pessoas e sua luta por uma reforma agrária mais justa.

Ao longo da abertura, os palestrantes discutiram a atual situação dos trabalhadores rurais e dos assentados do MST no país, bem como a medida provisória do governo Temer sobre a Reforma Agrária. Para eles, é um verdadeiro descaso o que ocorre atualmente em relação aos direitos das pessoas do campo.

“Pão, terra e paz continuam sendo uma necessidade histórica. A terra é dividida de maneira totalmente desigual, pois a Reforma Agrária jamais foi feita no país. A fome continua sendo uma realidade para uma grande parcela da população brasileira. A cada dia a nossa insegurança alimentar aumenta, pois a área de produção de alimentos no país vem diminuindo. E a violência infelizmente se faz presente no dia a dia do campo”, argumentou Alentejano.

O Massacre de Eldorados dos Carajás

Em sua fala, Marina dos Santos relembrou o Massacre de Eldorado de Carajás: “Foi um dos episódios mais tristes da história do MST no Brasil. Em 1996, 155 policiais militares promoveram um dos maiores massacres contra assentados do Movimento Sem Terra. Eles estavam acampados na chamada curva do S, na região dos Carajás, no Pará, em protesto pela Reforma Agrária no país. Quase 70 pessoas ficaram feridas e 22 morreram”.

Marina vê esse massacre como um símbolo de impunidade e violência extrema não só aos trabalhadores rurais, mas também ao ser humano. Para ela, 21 anos depois do ocorrido, nada mudou. A violência presente no campo ainda é forte.

Imagem colorida da roda de conversa no Prédio da Reitoria contra a criminalização dos movimentos sociais.
Roda de conversa no Prédio da Reitoria contra a criminalização dos movimentos sociais. Foto: Nadia Pereira de Carvalho

“Além de termos que conviver com toda essa dor, houve também recentemente outro massacre em Rondônia e o assassinato de um militante nosso em Minas Gerais e ameaças por parte de jagunços, fazendeiros e policiais. Abril tem sido um mês de dor, sofrimento e assassinato”, afirmou.

O setor agrícola nas mãos do capital estrangeiro

Alentejano também ressaltou que o mercado internacional controla a maior parte do setor de agricultura do país. Segundo ele, o grande capital transnacional está associado ao latifúndio e ambos têm apoio do governo brasileiro.
“Isso acontece devido ao fato de que nosso modelo agrícola é controlado pelas empresas transnacionais, ou seja, é uma produção que atende aos seus interesses de exportação: soja, milho, madeira, pecuária. A produção de alimentos básicos para os brasileiros tem diminuído em relação à produção de alimentos para a exportação. Por isso, falta pão na mesa do brasileiro”, argumentou.

Imagem colorida da Feira Agroecológica que foi realizada no Centro de Ciências da Saúde.
A Feira Agroecológica foi realizada no CCS. Foto: Nadia Pereira de Carvalho

O professor também mencionou o crescimento de hectares destinados ao plantio de cana, milho e soja. “Em 1990, eram 28 milhões de hectares e em 2013 esse número cresceu para 50 milhões. Enquanto isso, os hectares destinados ao plantio dos alimentos básicos do brasileiro, como arroz, feijão e mandioca, diminuiu drasticamente. Foi de 11,5 milhões de hectares para 7 milhões. Isso só prova que o setor agrícola do Brasil está nas mãos de estrangeiros, e não do brasileiro”, criticou.

As medidas do governo contra a Reforma Agrária. Leia mais.

 

Os debates ocorridos na 4ª Jornada Universitária em Defesa da Reforma Agrária (Jura) também colocaram em pauta as medidas provisórias editadas pelo governo de Michel Temer, supostamente favoráveis à Reforma Agrária.

“Na verdade, a Medida Provisória 759 é tudo menos a favor da Reforma Agrária. Essa medida privatiza os assentamentos agrários criados ao longo dos anos como forma de devolver essas terras ao mercado para serem recompradas pelo latifúndio. E ainda atribui ao poder público municipal o controle dos assentamentos daqui para frente. Praticamente, institui à compra de terras o único modo válido de se obtê-las”, explicou Paulo Alentejano, professor da Universidade Estadual do Rio de janeiro (Uerj)..

Marina dos Santos, dirigente do MST, concordou: “Acredito que nosso principal papel com o Jura é questionar o governo golpista e denunciar à sociedade as consequências dessa medida. E mostrar aos nossos jovens acadêmicos o que está por vir”.

Marina concluiu lembrando a necessidade de lutar para fazer o assentamento de todas as famílias que estão acampadas no Brasil: “Há cerca de 130 mil famílias acampadas em fazendas. O Incra, como órgão responsável, tem que voltar a fazer a vistoria dessas terras. Precisamos ocupar as áreas de terra que não cumprem o seu papel social segundo a Constituição Federal.”