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50 anos da ECO: do cerco militar aos desafios da era digital

A Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ completa 50 anos neste ano de 2017. No dia 13 de março, a coordenação e os alunos do Centro Acadêmico (CA) organizaram o 50 ECO, um evento de homenagens aos professores eméritos e fundadores. Além disso, também foram realizadas mesas-redondas, que contaram com a participação de alguns ex-alunos, incluindo Fátima Bernardes, apresentadora e jornalista da Rede Globo de Televisão.

O evento reuniu muitos dos nomes que fizeram parte da história da escola, desde sua fundação. O TJ UFRJ, telejornal da escola, com a colaboração da professora e vice-coordenadora da ECO, Cristina Rego Monteiro, produziu um vídeo de entrevistas com os professores mais antigos. O trabalho foi exibido no evento e já está disponível no canal do TJ UFRJ no Youtube (veja abaixo). Nele, os eméritos falam sobre os primórdios da escola e as dificuldades enfrentadas para torná-la uma das melhores escolas de comunicação do Brasil.

No início, uma escola de pensamento e experimental

O curso de Jornalismo foi o primeiro da área de comunicação na UFRJ. Antes da fundação da ECO, ele fazia parte do departamento da Faculdade de Filosofia e era vinculado ao curso de Letras. Depois que a escola foi criada, o curso se expandiu e pôde ser mais bem organizado no departamento específico.

A ECO nasceu em 1967 com um propósito diferente do que se tinha na época, em termos de comunicação. “Quando a escola foi fundada, adotou uma transdisciplinaridade baseada na filosofia e no direito. Por isso a raiz da escola é de reflexão e pensamento contemporâneo com base nas ciências humanas. Os aspectos de formação específicos foram chegando à medida que o tempo foi configurando essa necessidade. Mas ela é fundamentalmente uma escola de pensar, refletir e analisar”, conta Cristina, atual vice-diretora do departamento.

Imagem de Cristina Rego Monteiro, vice-diretora do departamento de jornalismo, e o diretor da ECO Amaury Fernandes com ex-alunos e organizadores do evento.
Cristina Rego Monteiro (ao centro), vice-diretora do departamento de jornalismo, e o diretor da ECO Amaury Fernandes (2º à esq.) com ex-alunos e organizadores do evento. Foto: Cainã Dittrich

O foco da ECO não era apenas o Jornalismo. Desde sua fundação, os cursos abordados eram Jornalismo e Editoração e Publicidade. Atualmente, os três primeiros períodos são compostos pelo Ciclo Básico, no qual os alunos aprendem sobre história e teorias da comunicação. Depois, eles são direcionados às seguintes habilitações: Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Rádio e Tv e Produção Editorial.

“Inventávamos nomes para dar maturidade e ir formando a ECO, assim ela começou como um campo experimental. Tínhamos que inventar o que era comunicação. E não era Jornalismo, porque se fosse comunicação-jornalismo teria sido fácil. A gente queria algo mais, e esse ‘algo mais’ é que deu o gás”, relembra Heloísa Buarque de Hollanda, uma das professoras homenageadas no evento.

Segundo os professores, a escola nasceu a partir da pluralidade de disciplinas, porém de maneira experimental. Para eles, ela era uma “folha em branco”, onde podiam criar disciplinas e moldar as ementas a partir das necessidades. Além disso, a escola surgiu com professores de diversas áreas das ciências humanas. Aos poucos, foi se tornando uma escola bastante respeitada. “A ECO era o sonho de consumo da juventude do Rio de Janeiro”, afirma o professor emérito Márcio Tavares em depoimento no vídeo comemorativo.

Imagem de Emmanuel Carneiro Leão e Márcio Tavares, professores eméritos da Escola de Comunicação da UFRJ.
Emmanuel Carneiro Leão e Márcio Tavares, professores eméritos da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ. Foto: Cainã Dittrich

Contexto histórico: os limites impostos pela ditadura

A ECO nasceu em 1967, três anos depois do golpe militar no Brasil, época marcada por histórias de censura, tortura e mortes. Assim como em inúmeras escolas ao longo do país, ela também presenciou as ações do regime autoritário.

O professor emérito Muniz Sodré, um dos fundadores da escola, vivenciou a época. Ele afirma que os militares encorajaram a sua fundação. “Os militares permitiram a criação da escola de comunicação como uma alternativa para controle de possíveis subversões que poderiam advir dos cursos de ciências sociais”, relembra.

No entanto, apesar do aval do regime, a escola também sofria pressões. “Muita gente aqui foi presa. Lá na Praça da República, a primeira sede da escola, vários professores foram presos e torturados, outros foram exilados. Nos sentíamos totalmente limitados”, afirma Sodré.

O Jornalismo e a crise da profissão

Nos últimos anos, a profissão de jornalista passou por muitas mudanças. Fatores como o surgimento de novas plataformas de notícias, a ascensão da internet e das redes sociais, o fim da necessidade do diploma e a pós-verdade são alguns dos motivos para a forte crise do antigo modelo de jornalismo.

Com a internet e a rapidez das notícias, um jornalismo diferente do tradicional mostrou-se necessário. Muitos blogs, portais de notícias e revistas online surgiram na última década e aos poucos tomaram o lugar do jornal e revista impressos. “Os jornais diminuíram, o emprego é restrito e a própria ideia da formação jornalística mudou quando chegou a rede eletrônica. As oportunidades estão todas na internet, ou seja, mudaram os critérios da notícia”, argumenta Sodré.

Nesse contexto, em 2009 o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a exigência do diploma para exercício da profissão de jornalista. Para Cristina, professora e também jornalista formada pela ECO, a decisão foi absurda. No entanto, em sua opinião, ela não afetou o curso de Jornalismo. “As instituições que vivem de informação, ao buscarem um profissional, preferem aquele que tenha uma formação com credibilidade e aval, algo que pode ser traduzido em diploma de uma instituição de qualidade”, destaca.

Imagem de Muniz Sodré, professor emérito e um dos fundadores da Escola de Comunicação da UFRJ.
Muniz Sodré, professor emérito e um dos fundadores da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ. Foto: Cainã Dittrich

O jornalismo na era da “pós-verdade”

Além disso, outro fator que afeta a profissão atualmente é o conceito de pós-verdade. O termo foi eleito como a palavra do ano de 2016 pela Universidade de Oxford, na Inglaterra. Segundo a definição do Departamento de Elaboração de Dicionários da universidade, é “um adjetivo que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”. Nem sempre verdadeiras, as notícias são compartilhadas de acordo com aqueles que a audiência busca. As redes sociais são o principal veículo de compartilhamentos de notícias fake.

Para a profissão, esse tipo de atitude é altamente prejudicial. “A pós-verdade é um termo cínico que afetou o jornalismo totalmente. No fundo, está se naturalizando uma mentira e dando a ela um estatuto intelectual. Pós-verdade! O que pode ser a pós-verdade? Seria outra verdade? Não. Ela é um falseamento, um truque, uma mentira. Isso não se pode chamar de informação”, argumenta Sodré acerca do tema.

“Comunicação: ciência do século”

Para Muniz Sodré, “a comunicação é a ciência do século.” Ele acredita que estamos vivenciando um longo e importante período de criação, estudo e formação de teorias sobre uma nova mídia: a internet.

Muniz afirma que “para se fazer a teoria de uma mídia nova, é necessário cerca de 40 anos. Foi assim com a televisão, o rádio e o jornal impresso. Ainda temos que ver o que que vai acontecer com a internet, daqui para frente”.

Veja o vídeo comemorativo dos 50 anos da ECO.