A crise financeira que afeta e compromete dramaticamente o funcionamento da gloriosa Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) acendeu o debate sobre o financiamento das instituições de ensino superior, o que insere na matéria as universidades federais. Sem ter a pretensão de dar números finais a tema cercado de polêmica e alternativas, o presente artigo procurará apresentar um quadro sobre a situação das universidades federais nos últimos anos, em especial da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e avaliação sobre caminhos a serem seguidos.
Em 2007, todas as instituições federais de nível superior – de acordo com suas características, capacidades e dimensionamentos – abraçaram o desafio lançado pelo Governo Federal de expansão da oferta de vagas e democratização do acesso aos cursos de graduação. Ao longo de uma década, foi possível constituir no Brasil uma das principais políticas públicas do país, mudando radicalmente o perfil socioeconômico dos alunos ingressos nos diferentes cursos de graduação.
A UFRJ, como uma universidade nacional, recebe alunos de todas as regiões e estados do país, por meio daxa0 adesão ao Sistema de Seleção Unificada do Ministério da Educação (SISU-MEC), o que deu proeminência à necessidade de recursos orçamentários e financeiros para fazer frente às demandas com assistência estudantil e políticas de permanência de alunos na universidade pública. Entre 2002 e 2014, a UFRJ passou de 25.507 alunos nos cursos de graduação para 47.992 estudantes ao final de 2014, um crescimento de cerca de 90% nas matrículas.xa0 Na pós-graduação, o crescimento também foi expressivo, passando de 9.534 para 12.005 estudantes no mesmo período, em torno de 26%.
A expansão de vagas e a democratização do acesso permitiram que a UFRJ recebesse os melhores filhos de nossas famílias, independentemente de sua origem socioeconômica: jovens talentosos, que expressam a qualidade daqueles que lutaram para alcançar a universidade pública. A possibilidade de que venham a abandonar a Universidade, em decorrência da falta de recursos para sua permanência, poderá custar ao país a perda de uma geração capaz de construir um futuro melhor para toda a população.
Contudo, inversamente ao crescimento do número de alunos, o orçamento das universidades federais decresce drasticamente ano após ano, conforme tabela abaixo, que evidencia decréscimo do orçamento da UFRJ a partir de 2014:
Para 2017, o orçamento total da UFRJ, sem contingenciamentos, é de R$ 417.229.255,00, com uma previsão de despesas na ordem de R$ 578.072.059,76 (valor próximo ao orçamento recebido no ano de 2013). Ou seja, em 2017 trabalharemos com despesas equivalentes a um orçamento defasado em pelo menos quatro anos.
Esse quadro tem gerado déficit corrente ao final de cada exercício, que vem se acumulando desde 2014, e aponta, num futuro próximo, para um cenário de grande insegurança para a manutenção das atividades acadêmicas e administrativas da instituição, ao somarmos os créditos insuficientes a cada ano com os débitos acumulados de exercícios anteriores. Fica evidente que a UFRJ vive, assim como as demais universidades do sistema federal, um quadro de subfinanciamento crônico, com recursos orçamentários deprimidos, para, minimamente, manter seus compromissos de funcionamento e garantir a consolidação de uma política pública construída com muito esforço pelo povo brasileiro na última década.
Esforços de gestão têm sido feitos, tais como controle de despesas com combustíveis e diárias, política institucional de racionalização do uso de energia, redução dos serviços terceirizados, revisão dos contratos dexa0 aluguel exa0 uso do patrimônio. Várias são as frentes em que a UFRJ tem atuado, porém sem axa0xa0 ilusão de que todo esse empenho será suficiente para cobrir suas necessidades financeiras.
Sobre a possibilidade recentemente ventilada de as Universidades virem a constituir fundos próprios de captação de recursos, os chamados endowments, é importante registrar que ainda não há previsão legal para tanto. Tramita na Câmara Federal, desde 2012, o Projeto de Lei nº 4643/2012 e no Senado, o Projeto de Lei no 6, que autoriza a criação de fundo patrimonial (endowment fund) nas instituições federais de ensino superior. A UFRJ tem acompanhando com grande interesse esse debate e o andamento dos projetos de lei e entende que a possibilidade de constituição de fundo próprio não pode servir de pretexto para desobrigação do poder público em relação à oferta de ensino superior público e gratuito ao povo brasileiro. Caso venha a ser aprovado pelo Congresso Nacional, esse patrimônio não poderá ficar à mercê dos contingenciamentos recorrentes sobre os orçamentos das universidades pelo governante de plantão.
As instituições públicas pagam,literalmente, o preço da política de terceirização adotada nos anos 90, em plena vigência da lógica neoliberal do estado mínimo, que transferiu para contratos com empresas o que antes era resultado do trabalho cotidiano de servidores, ocupantes de cargos hoje extintos, como vigilantes, marceneiros, eletricistas, copeiros, serventes, e outros da área da saúde, comoenfermeiros, médicos, nutricionistase fisioterapeutas. Assistimos à falência dos serviços públicos em âmbito municipal, estadual e federal, com a suspensão de serviços sem cobertura orçamentária, condenando milhões de brasileiros à humilhação diária de serviços que não são prestados, apesar da alta carga tributária sobre os trabalhadores.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro, ao reivindicar recursos orçamentários e financeiros minimamente compatíveis com seus imperativos de funcionamento e para seu crescimento, não está pedindo verbas para si. A instituição requer receber aquilo que é necessário ao cumprimento de seu compromisso público há quase um século, que notabiliza a UFRJ como a maior instituição federal do país, referência para todos nós.
Por fim, é importante reafirmar que qualquer país que tenha a pretensão de edificar um projeto de Nação – soberana, democrática, justa – deverá ter, na base desse projeto, a instituição universitária pública, gratuita, autônoma e com qualidade na produção da cultura, ciência, tecnologia, saúde, nos mais diferentes campos do conhecimento, propiciando ao seu povo o pleno desenvolvimento das suas humanidades neste planeta.
Pró-reitor de Planejamento e Desenvolvimento da UFRJ