Compositor, violonista, arranjador e produtor musical brasileiro, Mario Adnet, 68 anos, é um talentoso artista do nosso país que já esteve ao lado de grandes personalidades da nossa música popular: Cláudio Nucci, Danilo Caymmi, Jaques Morelenbaum, Ivan Lins, Joyce, Paulo Moura, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Tom Jobim, entre tantas outras. E a Escola de Música (EM) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) resolveu render uma homenagem ao músico com a concessão do título de Notório Saber, entregue a uma pessoa com conhecimento excepcional em uma área específica. O evento acontece às 14h do dia 21/10, no Salão Leopoldo Miguez, na Rua do Passeio, 98, Centro, Rio de Janeiro.
A ideia da homenagem partiu do professor Carlos Almada, da EM, que há muitos anos acompanhava o trabalho do artista antes de ter um contato pessoal. “Em 2019, ocorreu o nosso encontro. Dois alunos meus que trouxeram o Mário e o Paulo Jobim (filho do maestro Tom) para visitar nosso grupo de pesquisa que terminava naquela época uma análise minuciosa da harmonia do Tom Jobim. A partir daí mantivemos contato constante”, contou Almada.
Segundo o professor, o título é para dar valor à excelência do trabalho do Adnet e de sua extensa experiência, bem como das inúmeras contribuições que trouxe (e ainda traz) para enriquecer a nossa belíssima e sofisticada música popular. “Para nós, do Programa de Pós-Graduação em Música da UFRJ, e, especialmente, para mim, que tenho como principal interesse de pesquisa os estudos sistemáticos em música popular, é bastante honroso ver ser outorgado a ele esse título. É o reconhecimento formal da academia a um profissional de altíssimo nível artístico e de talento único em nossa área”, afirmou.
Carreira artística
A carreira de Adnet começou em 1980, quando ele lançou ao lado de Alberto Rosenblit um LP (long play, como era chamado o disco de vinil com várias músicas) independente. Muitos outros trabalhos se seguiram, como os songbooks, produzidos por Almir Chediak, de Ary Barroso (como arranjador e instrumentista) e de Tom Jobim e Dorival Caymmi (como arranjador, instrumentista e intérprete).
De acordo com Mário Adnet, a música entrou de forma avassaladora em sua vida, o que o fez abandonar a faculdade de Arquitetura. Os anos foram se passando desde o primeiro emprego na gravadora Polygram, onde, de forma ousada, abraçou todos os desafios propostos para trabalhar em um disco de Beth Goulart, filha dos renomados Nicette Bruno e Paulo Goulart. “O (Roberto) Menescal ouviu o disco independente e me chamou para trabalhar na gravadora. A partir daí, eu fiz várias coisas e fui desenvolvendo e aprendendo os códigos musicais, algo que vai além da técnica e do ouvido. Eu precisava sobreviver e tive o apoio de minha mulher sempre”, revelou ele.
Nos anos 1980, Adnet se dedicou ao estudo de harmonia e arranjo com Luiz Eça e, em seguida, com Ian Guest. Na mesma década, ele lançou Planeta azul, seu segundo LP, dessa vez solo, com a participação de Jaques Morelenbaum, Joyce, Luizão Maia e Hugo Fattoruso.
Em 1994, Tom Jobim gravou seu arranjo de Maracangalha (Dorival Caymmi) no CD Antonio Brasileiro, que foi premiado com o Grammy, na categoria Jazz Latino. Interessante é que o arranjo foi apresentado anos antes ao próprio maestro pela irmã de Adnet, Maúcha, na época vocalista da Banda Nova, que trabalhava com o maestro. Ela mostrou o trabalho a Tom que, imediatamente, o incorporou ao repertório do conjunto.
Em 2000, lançou pela Indie Records/Universal Music o CD Para Gershwin e Jobim, que contém composições próprias como An american no samba, Jobim in heaven e Trote da raposa, O disco contou com a participação de músicos norte-americanos, como Randy Brecker, Eddie Gómez, Billy Drews e Jay Ashby, e brasileiros, como Romero Lubambo, Nilson Matta e Marcos Nimrichter, entre outros, além da participação de seus irmãos Chico (pai do humorista Marcelo Adnet) e Maucha nos vocais, e de sua filha Joana na faixa Love is here to stay. No ano seguinte, ao lado do saxofonista Zé Nogueira, foi a vez de Ouro-Negro, consagrado e premiado álbum duplo dedicado à obra do maestro Moacir Santos.
Entre 2001 e 2003, Adnet lançou Rio Carioca, álbum autoral dedicado à cidade do Rio de Janeiro e o álbum duplo e DVD Jobim Sinfônico, projeto idealizado e produzido por ele e Paulo Jobim (filho do maestro), registro da obra orquestral de Tom Jobim, gravado ao vivo na Sala São Paulo, com a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo e participação de Milton Nascimento.
Adnet é vencedor de dois Grammys Latinos e oito Prêmios da Música Brasileira. Ganhou em 2004, com Paulo Jobim, o prêmio de melhor CD clássico por Jobim Sinfônico (também indicado ao Grammy Americano em 2005 na categoria Crossover). Além disso, recebeu cinco indicações ao Grammy Latino: Jobim Jazz ao Vivo (na categoria de melhor álbum de jazz latino em 2016), Dorival Caymmi Centenário ‒ com Dori Caymmi (nas categorias de produtores do ano e melhor disco de MPB em 2015), Um Olhar sobre Villa-Lobos (na categoria melhor álbum de música clássica em 2013) e Choros & Alegria: Moacir Santos – com Zé Nogueira (na categoria de melhor álbum instrumental em 2006).
Em novembro de 2021, ganhou mais um Grammy Latino, na categoria de gravação do ano, como produtor do single Talvez de Caetano e Tom Veloso, música de Cézar Mendes e Tom Veloso. No ano seguinte, finalizou as orquestrações de um concerto sinfônico inédito com obras de Luiz Eça. “Sempre foi muito bom trabalhar com pessoas que eram meus ídolos. O maestro Tom Jobim sempre foi muito generoso comigo. Mas tive na minha trajetória encontros que marcaram muito com o Moacir (Santos) e o Eça, por exemplo, entre tantos outros.”
Para Adnet, a homenagem da Universidade é a coroação de um trabalho. É como se a academia dissesse a ele que valeu a pena todos os momentos vividos, de tudo que ele foi buscar e entendeu nessa procura. “Mas sem fechar um ciclo. Eu quero trabalhar com gente nova, com os filhos dos ídolos, que são excelentes, como o Tom Veloso e a Lulu Gilberto”, revelou ele, que prepara uma homenagem dela ao pai, João Gilberto. E, em 2026, estão para sair duas novas produções: no início do ano, um disco com o irmão Chico Adnet, dedicado aos anos de ouro da MPB, e, mais perto do segundo semestre, um novo disco autoral.
“Esse reconhecimento acadêmico pelo meu trabalho muito me orgulha, me dá uma felicidade enorme, pois de uma forma ou outra eu fui para a vida aprender a fazer”, concluiu Adnet, que prometeu dar uma “canja” de improviso ao lado de amigos músicos como Jorge Helder e Marcelo Costa.
