"Gosto de assistir ao ritual de mudanças do público quando exponho meus trabalhos", disse o auto-denominado "artista de parede", em palestra proferida na UFRJ, no último dia 5.

">"Gosto de assistir ao ritual de mudanças do público quando exponho meus trabalhos", disse o auto-denominado "artista de parede", em palestra proferida na UFRJ, no último dia 5.

">
Categorias
Memória

Vik Muniz e suas outras metades

"Gosto de assistir ao ritual de mudanças do público quando exponho meus trabalhos", disse o auto-denominado "artista de parede", em palestra proferida na UFRJ, no último dia 5.

 “Como artista, eu só faço a metade do trabalho. Quem faz a outra metade é o espectador, que assiste e se relaciona com a obra.” Essa é a opinião de Vik Muniz, fotógrafo e artista plástico brasileiro, que apresentou seus projetos e compartilhou sua trajetória pessoal no ciclo de palestras Fotografia Contemporânea: Arte e Pensamento. O evento, organizado na quinta-feira (05/11) pelos professores da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ Antônio Fatorelli e Victa de Carvalho, foi realizado no Salão Dourado do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ e serviu para que os alunos da ECO se aproximassem da Comunicação Visual.

Mundialmente reconhecido por suas fotografias, que retratam as obras que compõe com materiais inusitados – como arames, poeira, lixo, brinquedos, entre muitos outros -, Vik afirmou que antes de se definir como artista chegou a trabalhar em diversas áreas. “Meu interesse por arte só surgiu aos 32 anos, quando comprei minha primeira máquina. Foi na fotografia que pude me encontrar, pois tive como reunir todos os meus outros campos de interesse em um só”, explicou.

Sua alfabetização tardia, segundo ele, foi fundamental para que desenhasse desde pequeno e tivesse sempre uma visão aguçada. “Quando aprendi a ler, só entendia as palavras que decorei, por isso era aquele garoto que sentava lá no fundão e fazia caricaturas dos professores. Meu caderno era cheio de hieróglifos”, contou ele, fazendo referência ao desenvolvimento visual que hoje em dia lhe permite ter uma noção diferenciada sobre fotografia.

Para Vik Muniz, a adolescência vivida no Brasil, em plena Ditadura Militar, também foi essencial para sua formação. “Naquela época, tudo era muito metafórico. Os pensamentos eram expressos por debaixo dos panos, o que de certa maneira reflete nos meus trabalhos”, disse. Por sorte, por causa de uma fatalidade, Vik deslanchou profissionalmente. Ele contou que foi baleado na perna e que recebeu um dinheiro do atirador para bancar os custos médicos. “Peguei o que sobrou do dinheiro e comprei uma passagem para os EUA”, se divertiu.

“Sou um artista de parede”

Após algum tempo à deriva em Nova York, visitando galerias e exposições, ele decidiu que seguiria a carreira de artista plástico. A ideia de registrar suas obras só veio quando um fotógrafo profissional documentou seu trabalho e ele não gostou do resultado. “Decidi que eu mesmo faria isso. Apesar do filme, da luz, da câmera, do laboratório, de tudo errado, percebi que as minhas fotos estavam muito melhores”, contou Vik. A explicação para isso, de acordo com o artista, é simples. A realidade daquela imagem estava apenas na sua mente, que possuía uma imaginação única sob sua perspectiva.

A partir de então, o artista plástico e fotógrafo emendou uma série atrás da outra. Entre as mais importantes, estão a que apresenta crianças caribenhas desenhadas em açúcar, a que documenta a vida de catadores de lixo com sucatas e a que retrata divas do cinema através de diamantes. Na opinião de Vik, sua posição como artista é uma das poucas que têm a chance de transitar tão facilmente entre dois mundos tão distintos, como a riqueza e a pobreza.

“Todas essas possibilidades tornam minha obra indefinida, espacial e temporalmente. Gosto de assistir ao ritual de mudanças do público quando exponho meus trabalhos. Sou um artista de parede”, se definiu Vik Muniz, fazendo referência à inclinação corporal que as pessoas fazem quando visitam os museus. “Elas se dividem entre se aproximar, para observar os detalhes de composição da matéria, e se afastar, para poder visualizar mais abertamente a ideia e a mente do artista. Geralmente, todos acabam preferindo um ponto de segurança entre mente e matéria”, concluiu.