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Educação Formal e Práticas Pedagógicas Informais

O curso de extensão Educação e a Sociedade Brasileira Contemporânea, organizado pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FE/UFRJ), com apoio do Fórum de Ciência e Cultura (FCC/UFRJ), discutiu dia 2 de outubro, o tema “Educação Formal e Práticas Pedagógicas Informais”. Para compor a mesa, foram convidadas Fernanda Delvalhas Piccolo, professora da FE/UFRJ e organizadora do evento, e Luciane Soares, doutoranda em Sociologia pelo Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS/UFRJ).

 Fotos: Fábio Portugal
  

Fernanda Delvalhas Piccolo, professora da Faculdade
de Educação da UFRJ, conta da experiência no Morro
dos Macacos de um Centro Comunitário para educar
jovens entre 14 e 20 anos

Fernanda relatou sua experiência com um centro comunitário no Morro dos Macacos, localizada no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, em que analisou as redes de relações sociais que ali estavam estabelecidas. O centro, por definição, dedicava-se a educar e promover atividades diversas com jovens de 14 a 20 anos que estivessem na chamada “situação de risco social”, por exemplo, moradores de áreas pobres da cidade, que consumissem ou traficassem drogas, bem como os que tivessem uma escolaridade baixa ou uma estrutura familiar rompida.

A diretora do centro na época, segundo Fernanda, descrevia como objetivo do projeto educar esses jovens tanto formalmente, adotando didáticas típicas da escola, como “para a vida”, ensinando com foco na civilidade. A idéia era profissionalizar e encaminhá-los para o trabalho o que, na prática, esbarrou com exigência dos empregadores por um nível de escolaridade mínimo que os associados do centro, em geral, não possuíam.

O grupo comunitário utilizava, para disciplinar seus associados, técnicas de punição e recompensa em dinheiro de acordo com o nível de dedicação e colaboração com os programas criados pelos organizadores.  Porém, um problema percebido por Fernanda era que “o centro muitas vezes agia no sentido de reforçar ao invés de combater a estrutura social vigente. Passavam o recado de que a realidade era aquela e os jovens precisavam aceitar isso e se adaptarem. Ao mesmo tempo em que conferiam àqueles garotos e garotas a base para construírem um projeto de vida, os organizadores limitavam estes projetos pessoais. Os estudantes sonhavam com Medicina, Direito. O centro oferecia cursos de padeiro, manicure, entre outros, que não se encaixavam no desejo por uma profissão típica do Ensino Superior”, relata a educadora.

 

Luciane Soares, doutoranda em Sociologia pelo IFCS,
revela o uso do Rap com fins pedagógicos em escolas
da periferia do Rio de Janeiro

Luciana, por sua vez, explicou seu projeto de pesquisa em que analisa a construção cultural do Rap no Rio de Janeiro e sua forte influência na periferia da cidade. “É um ritmo de produção relativamente barata, que não exige muito equipamento e nem conhecimento musical profundo”, define. Ao contrário do Funk, o Rap não se propõe ao divertimento, produzindo discursos de reivindicação e de quebra com o contrato social, que podem até mesmo ser agressivos. A adesão ocorre porque a juventude da periferia pode “ver-se espelhada, ver sua área cantada, ver o sofrimento de seu grupo social exposto”, argumenta a pesquisadora. O problema é que o estranhamento inicial que o Rap provoca na população gera uma desconfiança e a crença de que apreciadores desta música têm uma inclinação comportamental violenta.

Entretanto, Luciana destaca ao final da palestra que, tirada esta percepção superficial, houve um grupo de educadores que soube tirar do Rap um propósito didático. Segundo ela, uma das maiores fraquezas do ensino público nas periferias é a dificuldade de relação entre os professores e os alunos. Geralmente, estes dois grupos vivem em realidades sociais e culturais distintas e, sem haver um real esforço para o diálogo, o educador parte do princípio que sua platéia é desinteressada e tem baixa capacidade de aprendizado, enquanto os jovens olham para a figura do professor como alguém com quem não podem se identificar e de quem não podem aprender nada. A experiência inaugurada em alguns lugares modifica esta condição de apatia entre os dois grupos e revela que em áreas escolares de periferia o Movimento Hip-Hop funciona como um eficiente recurso de ensino, criando nos estudantes uma disposição maior a se dedicarem ao conteúdo que está sendo passado, com declarações de que o aprendizado ficou facilitado, por exemplo, na disciplina História.